quarta-feira, 4 de novembro de 2009

A ARTE DE ENVELHECER





Dona Nair Viegas faz 100 anos esta semana. Que privilégio! Presenciar a passagem do cometa duas vezes, como ela mesma diz: - Não é pra qualquer um , não senhor!

Paraibana do sertão nordestino, dona de uma inegável autoestima e de uma personalidade intensa ( alguns diriam arretada mesmo).

Deixou o sertão com apenas 15 anos de idade, em busca dos seus sonhos. Naquele tempo, uma menina era muito mal vinda para uma família de agricultores, pois não era uma mão de obra viável para a lavoura.

Contra todos os preconceitos de uma época, lá se vai a valorosa Nair para a cidade de pedra, (naquele tempo, não tão pedra assim) chamada São Paulo.

Trabalhou com muito vigor e ânimo em casa de família e numa delas (uma casa de europeus) adquiriu uma elegância e um estilo finíssimo que carrega até hoje.

Mudou de ares, foi para o Rio de Janeiro, ajudou seus irmãos na Paraíba e finalmente foi para Ilhéus, onde encontrou o amor da sua vida. O fazendeiro de cacau, filho de uma linhagem lendária na região, entre índios e ciganos espanhóis).

Teve 9 filhos, 6 deles morreram de doenças que não haviam vacina para curar e isso não tirou a alegria dela viver.

Que vigor, que amor pela vida! Sempre respeitou o tempo. As marcas da idade demoram muito a surgir e quando surgiram , comprou uma tintinha ...

Nunca vi se entregar para a idade. Nunca colocou limites para fazer o que tinha vontade.Faz pouco tempo que parou de viajar de avião sozinha (Não é que não queira). Dona de uma fé inabalável , lutou para reconstruir sua vida, quando perdeu tudo junto com o marido, após os 50 anos de idade.

“O dia para usar roupa nova é hoje mesmo”, um dos seus maiores lemas.

“Dinheiro é meu escravo” ele tem que me obedecer.

“A maior derrota da vida dela”, é se arrepender de não fazer algo que só ela podia ter feito.

“Rir da vida” acredito que ela riu tanto, foi tão feliz, dona de uma alegria e de um carinho tão contagiante que as rugas demoraram a aparecer e o coração como diz o médico, parece o de uma menina de 15 anos.

E as estórias da Dona Nair? Ela seria uma excelente escritora se não fosse analfabeta. Sempre contou as estórias de Jorge Amado como se fossem dela e as suas próprias estórias incríveis e mirabolantes como se fossem de qualquer outra pessoa, de tão fascinantes.

Viver bem. “ Filha só não há jeito para morte”....Ao contrário daquele triste comercial dos chinelos Havaianas, seus conselhos sempre foram sábios.

Filha, você sabe que as plantas escutam a gente? Eu converso com elas todos os dias, por isso elas retribuem com muitas flores pra mim...

E os bichos? - Bicho faz bem pra gente....E lá vinha ela de novo contando a estória do seu galo de estimação....

Envelhecer é uma arte. A vida como Dona Nair viveu até agora é uma tela onde ela pintou coisas preciosas. Viveu para contar, como ela sempre diz.

A maneira como Dona Nair escolheu para envelhecer, não deixa de estar relacionada com o que Winnicott abordou em suas teorias acerca da psicologia. Sua reação frente ao envelhecimento é uma resposta as experiências que viveu na infância, que serviram como um espelho estruturante, que ela sempre pode olhar com muitos desafios.

Envelhecer é uma arte que requer dois caminhos: isolamento ou a possibilidade de elaborar criativamente esta fase.

Dona Nair ainda é criativa nisso. Ela faz 100 anos. Seu currículo: 3 filhas maravilhosas e excelentes mães, 10 netos e 3 bisnetos. Agregados à ela , um número incontável de amigos que formam sua família.

Dona Nair Viegas, com muito orgulho, minha avó.Uma verdadeira artista da vida e serva de Deus!

4 comentários:

  1. Quando o pensar em evelhecer começa a ser mais frequente, descobrimos que estamos ficando velhos.Mas isso é bom, assustador mais bom. Ver histórias de pessoas que envelhecem com alegria faz a nossa caminhada um pouco mais confortável.Paz.

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  2. Que grata surpresa saber que essa mulher admirável é sua avozinha!!!!
    Agradeça a ela pelo seus cem anos, pois quem ganhou o presente fui eu.
    Um exemplo essa mulher!!!!

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  3. Mari... acredito que só escreve quem sempre gostou e ouviu muita estórias, pois sempre tem algo a dizer.
    Agora entendo o seu gosto pelas letras... QUE EXEMPLO! Valeu compartilhar sua estória...Bjs

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  4. Ah , eu adoro escrever...sempre me disseram para escrever um livro...mas confesso que nao teria escrito tao bem assim, sobre nossa Avó. Tive crise de velhice aos 25 anos de idade...pois já pensava nos 30 ...o medo de envelhecer me tomava conta.Sempre fui muito vaidosa...ainda sou...mas a vida tem me ensinado ou melhor, Deus tem me ensinado que a beleza também é saber envelhecer... Hoje estou com 39, confesso que nao falo para todos,se puder pular essa parte eu pulo...rsrs...Deus pela sua graca e misericórdia me deu um filho de presente e hoje sinto que deixo uma semente minha na Terra, e isso me tirou o medo de envelhecer. Agora quero envelhecer sim, mas como Dona Nair no artigo acima...meu lema também é " dia de usar roupa nova é hoje"...Fica na Paz do Senhor! Bjs.Mona.

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Poemia

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